CRÍTICA | Web-série | Frankenstein M.D.

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Frankenstein, MD é uma web-série “educacional” apresentada pelos (quase) médicos Victor(ia) Frankenstein e Iggy DeLacey, da universidade ficcional Engle State. A web-série funciona em formato de transmedia, utilizando vlogs para contar a história, de forma semelhante a outros projetos de Pemberly Digital como The Lizzie Bennet Diaries (já comentado aqui no blog) e Emma Approved.
A ideia de explorar clássicos através do formato de vlog é bem criativo e adoro esse formato de conteúdo e estilo de narrativa. Ao transformar o livro de Mary Shelley em uma web-série, os produtores não só aguçam a curiosidade dos expectadores em relação ao material que os inspirou, mas também serve como um tributo tanto para a autora (ainda que ela não possa vê-lo, obviamente) e para os fãs do livro. 
 
Quando eu li o livro uma coisa ficou clara para mim: o monstro não é o vilão da história. Se existe um vilão, é Victor Frankeinstein. Ele tem seus motivos, mas há barreiras que não se pode ultrapassar sem aceitar as consequências dos seus atos depois e a web-série faz um bom trabalho mostrando o descenso de Victória até a loucura. Ela demonstra desde o começo sua ambição e orgulho, características essas que são necessárias para que ela consiga avançar no campo de pesquisa médica, que é, até o momento, largamente povoado por homens. Contudo, desde as primeiras cenas nós já recebemos pistas de quem ela vai se tornar no futuro.
Sua ambição em se tornar uma cientista respeitada por vezes se traduz em uma visão muito estreita em relação ao que é necessário para o sucesso em pesquisa. Ela é cega quando se trata de ética e para Victoria, os fins justificam os meios quando se trata de avanços científicos. Ela não está acima de tratar o seu colega de trabalho Iggy como rato de laboratório ou mesmo seus amigos de infância. 
Isso fica claro desde o começo, quando já no segundo episódio ela fala algo que resume a sua visão em relação ao progresso da ciência: “As únicas limitações da ciência são aquelas que pessoas criam porque tem medo ou são fracas”.
Aliás, o mesmo episódio faz um ótimo trabalho estabelecendo as motivações de Victoria e o que a leva a agir de uma forma tão dura e superior. Em sua conversa com Dr. Abraham Waldman, fica claro como é difícil para ela navegar em um campo dominado por homens e como sua mãe foi desconrajada pelos pesquisadores da mesma universidade, porque ela deveria “arrumar uma família e desistir da pesquisa cientifica”.
Não dá para fazer uma adaptação de Frankenstein sem o monstro e Frankeinstein, MD consegue lidar com essa parte da história de um jeito maravilhoso. Não vou discutir detalhadamente como, porque isso é uma das partes cruciais da história, mas vou apenas dizer que o jeito como os escritores fizeram os elementos científicos dos vlogs prenuncia o que vai acontecer, ao mesmo tempo em que lhe dá um soco no estômago quando realmente acontece.
Ainda que tenha elementos obscuros e seja o projeto transmedia mais dark da PD até o momento, a escrita da web-série me lembra por vezes de um sitcom sem laughtrack (sem aquelas risadas de séries de comédia como Two and a Half Man, por exemplo). A escrita é peculiar e isso se reflete também na personalidade de alguns personagens, principalmente Eli e Iggy.
Além disso, a escolha de mudar o gênero de alguns personagens permite que tenhamos uma protagonista feminina forte e decidida, ao mesmo tempo em que isto é um comentário social em relação a inserção de mulheres em campos que são historicamente “pertencentes” ao sexo masculino. Algo interessante também, é que embora o livro tenha sido escrito por uma mulher um dos meus problemas com ele sempre foi a passividade com que as mulheres eram escritas.
No livro, quase não há mulheres e as que existem não tem um papel essencial ou mesmo uma personalidade forte. Enquanto isso, a web-serie faz um ótimo trabalho em dar voz e espaço para ambos os sexos, tendo Victoria como personagem principal, mas ao mesmo tempo dando espaço para outros personagens se desenvolverem de forma satisfatória. 

Os episódios estão disponíveis no Youtube no site de PBS Digital Studios. Até o momento só está disponível a opção de legenda em inglês: